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Em finais de 2013, quando conheci o desemprego pela...7945638ª vez, uma das coisas que mais odiava mas que era obrigado a fazer para além daquelas apresentações quinzenais patéticas na Junta de Freguesia, era ter que correr todas as mercearias e botequins da minha aldeia para carimbar a minha folha de presenças do Centro de Emprego para comprovar desse modo a minha procura activa de emprego. Odiava fazer aquilo porque não passava de uma palhaçada que não resultava em nada nem dava para justificar porcaria nenhuma. A gente entrava nas lojas e nos cafés, pedíamos amavelmente a porra do carimbo e saíamos de lá exactamente iguais ao momento em que decidimos entrar. Sem emprego, sem futuro, sem expectativas, e muitas vezes com menos dinheiro na carteira porque a vergonha levava-nos a pedir um café para quebrar o gelo antes de ganhar coragem para apresentar a folha maldita. Numa dessas vezes, lembro-me de entrar na loja de electrodomésticos mais conhecida das minhas redondezas onde, por tradição, a minha família tinha por hábito fazer muitas compras e encontrei por lá o filho do patrão recém licenciado em Relações-Comerciais-Internacionais-das-Parvoíces que não cabia em si de contente por estar a ocupar o lugar de atendimento numa loja de aldeia que sempre sonhou e para o qual estudou aqueles anos todos. Mesmo sem conhecer devidamente aquele "Ponta de lança" senti-me perfeitamente à vontade para dizer-lhe amavelmente que não precisava de comprar nada e que apenas necessitava que ele carimbasse a minha folha do IEFP. Qual não foi o meu espanto quando o coisinha, no alto do seu pedestal do homem mais idiota do século, negou-se a fazê-lo alegando a desculpa de que não era ético nem justo nem correcto comprovar a realização de uma entrevista de emprego que na prática não existiu. «..Só assino se vieres aqui pedir emprego..», disse-me ele. Aceitei educadamente os seus argumentos, agradeci o tempo que ele me tinha dispensado e saí sorridente e totalmente satisfeito daquele estabelecimento, não pela lição de pseudo-justeza, hombridade e honestidade, que tinha recebido na dita loja mas sim porque tinha a profunda certeza de que ele tinha acabado de fazer merda da grossa. Uma conclusão que veio a confirmar-se apenas quatro anos depois. Ontem, para ser um pouco mais preciso.
Como a minha moradia ganha facilmente muita humidade e o inverno, apesar do outono ter parecido um pouco esquisito, começa a dar sinais de poder estar a aparecer, tive necessidade de dirigir-me ontem à Worten para comprar um desumidificador que não fosse muito caro mas que fizesse bem o seu trabalho, porque se não resolvesse esse problema já sabia que a minha mulher ia estar sempre a moer-me o juízo dia e noite até o meu cérebro ficar em papas e que, apesar da alta concentração de humidade existente na casa, arriscava-me a ficar em seco o resto deste ano e quiçá o primeiro semestre do próximo que ainda estava para vir (sexualmente falando é claro). Vinha eu a sair da Worten com o dito aparelho nas minhas mãos quando dou de caras com o Sr José, homem de 70 anos e (ainda) proprietário da loja de electrodomésticos mencionada no texto em cima. Depois de cumprimentar-me e olhar com certo espanto para o aparelho que tinha acabado de comprar, perguntou-me se ele tinha sido muito caro. Quando ouviu da minha boca que tinha sido 99 Euros, o homem nem queria acreditar e notei que ele ficou até um bocadinho amuado porque na loja dele também tinha daqueles equipamentos à venda pelo mesmo preço ou até mais barato e, não tendo sido uma promoção, percebi que ele esperava receber outro tipo de consideração da minha parte por sermos gente da mesma freguesia. Foi ai que, ainda que não sentisse necessidade de justificar-me, decidi aproveitar o momento para abrir o meu livro de memórias e contar-lhe a passagem que tinha ocorrido 4 anos antes, entre mim e o seu querido e mui estimado filho. "Tudo isso por causa da merda de um carimbo???" perguntou-me ele. "Sim - respondi eu - tu já sabes como eu sou. Posso não falar nada porque nunca gostei de exibir-me nem ando aqui a fazer circo mas quando me fazem uma sacanice nunca perdoo". Podia calar-me e deixar as coisas naquele ponto mas o homem pior ficou quando soube que depois daquele episódio já tinha comprado uma máquina de lavar, um fogão e um frigorífico novo. "Que posso dizer-te? Fiquei com tanta vergonha que nunca mais consegui encarar o teu filho" ironizei eu. O homem meteu as mãos à cabeça e parecia que tinha levado um autêntico soco no estômago e eu sentia-me a sorrir todo por dentro. Todo eu era contentamento. Não sei o que vai acontecer daqui para a frente pelos lados do senhor doutor moralidades-não-sei-quê mas acho que o serviço meteorológico prevê que possa aparecer um grande temporal e muita trovoada por aquela zona. Uma tempestade com ventos ciclónicos tão fortes que pode haver o risco de alguns distraídos levarem com uma tigela de carimbos bem em cheio na testa. "Pai rico, filho nobre, neto pobre"...diz o ditado e muito bem.
Ah! És cá dos meus, catano! Muito bem feito! Se há criaturas que não suporto, são engenheiros e doutores da mula russa com a mania que trazem a monarquia inteira na barriga!
ResponderEliminarEu muito pelo contrário Quarentona, são as criaturas que mais adoro! hehehe :))
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